Não pretendo aqui discutir qual a natureza das leis universais. Não é esse o escopo deste texto. Pretendo, sim, provar que elas não seriam contrárias à intervenção direta de Deus na sua criação, e que os constantes atos dessa intervenção não seriam constantes consertos de uma natureza que precisasse ser modelada. Pois essa confusão nasce da visão de que, se existem leis naturais, o universo não precisa de ajuda para vir a ser o que ele é e o que está destinado a ser. Essa seria a função das leis universais, levar a criação ao seu destino. Contudo, e se uma dessas leis for justamente a possibilidade da intervenção externa?
A criação, toda a criação de Deus, desde as mais complexas e grandiosas galáxias, até a mais diminuta partícula subatômica, é uma realidade aberta. Nada em si mesmo é auto-suficiente, no sentido de que é infenso a qualquer interferência exterior. Podemos, desse modo, dizer o mesmo da criação em conjunto. A criação foi moldada por Deus de modo que Ele mesmo possa interferir nela, para que Ele pudesse ter intimidade com a sua obra. Isso não é contrário à natureza das coisas, uma vez que essa abertura mesma faz parte dessa natureza. A criação é uma realidade aberta e naturalmente receptiva à ação poderosa de Deus.
Muitas pessoas dizem que não existe coincidência no mundo, existe providência. Na verdade, se uma dessas realidades negasse a outra, não existiria nem uma nem outra. Se não existisse providência, a coincidência, ou seja, a aleatoriedade, se transformaria em puro acaso e despropósito. O mundo se transformaria em um conjunto cego de eventos sem controle nem finalidade. Por outro lado, se existisse somente a providência, esta seria praticamente um destino imperioso, sem que houvesse possibilidade para uma configuração própria da vida e do universo. Acho que a posição mais correta é aquela que vê que a providência, ou seja, a ação direta de Deus nos destinos do homem e do universo, acontece nas várias possibilidades de ser das coisas, ou seja, na aleatoriedade. Entre as várias possibilidades, Deus interfere, conduzindo a uma delas.
Isso não significa a perda da autonomia da criação. Nós não podemos confundir autonomia com auto-suficiência. A autonomia é a qualidade de quem tem um ser, e a auto-suficiência é a qualidade de quem cujo ser se basta a si mesmo. A criação é autônoma, mas o seu ser não se basta, e não seria o que é sem sem a ação direta e constante de Deus. Esta não é um ato de conserto, como se o universo fosse deficiente e precisasse de ajuda. Ela configura o próprio ser do universo, sendo este uma realidade concreta, mas aberta, por suas próprias leis, à intervenção todo-poderosa de Deus.
Postado por Ney César.
Gostaria de fazer uma correção ao texto acima. O físico autor do texto citado, Alexandre Zabot, não defende que Deus age remendando a criação. O que ele cita em seu texto (http://agapegrupodejovens.blogspot.com/2009/12/ha-proposito-na-evolucao.html) é que a posição do Desing Inteligente é criticada por muitos teólogos por apelar para um “Deus de lacunas”, ou seja, um Deus que fica remediando a criação. Alexandre Zabot ressalta que essa teoria não é bem vista pela ciência nem pela teologia e deixa a entender que ele também não concorda com ela. A posição que ele demonstrou mais coerente do ponto científico e teológico que se por um lado há aleatoriedade nas mutações, não há aleatoriedade nas leis físicas. Essa posição é tida como Propósito de Deus na Criação e ela diz: "Se as mutações genéticas são aleatórias, as leis físicas não são e conduzem a natureza para um fim específico, em última análise desejado por Deus, que é o criador destas leis.” Lembro a todos que tanto a posição do desing inteligente do propósito de Deus na criação são posições teológicas que buscam respaldo na ciência. Alexandre demonstrou que a posição do propósito de Deus na criação tem respaldo científico e teológico e parece ser aceita para o autor. Particularmente, apesar de entender um pouco de religião, não tenho conhecimentos teológicos suficientes para dizer que a posição do propósito de Deus na criação seja errada, mas, apesar disso, ela me parece ter certa coerência. Como uma cientista natural (Bióloga) não vejo contradição dessa posição com o fato da evolução das espécies. Isso não quer dizer que eu seja contra o exposto no texto acima, da intervenção constante de Deus, é uma possibilidade, mas teologicamente não tenho conhecimentos para me posicionar. Devemos porém diferenciar duas coisas: uma é o curso do universo, do mundo físico regido por leis naturais, outra é a vida humana, nossa trajetória como indivíduos dotados de inteligência e alma, que além da dimensão física, temos a espiritual. Caso Deus tenha criado o mundo físico com suas leis naturais e exercer pouca interferência a partir daí não se opõe ao fato Dele interferir em nossa história humana (providência) quando nós O permitimos, pois também devemos lembrar que Deus nos dá o livre arbítrio e não interfere em nossas escolhas, a não ser quando O permitimos. A questão se Deus criou o mundo físico com suas leis e a partir daí exerce pouca ou nenhuma interferência ou se Ele interfere constantemente nos destinos da criação é uma dúvida par mim. Particularmente creio que somente Deus poderá nos revelar isso quando um dia O contemplarmos face a face.
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